Certamente você já conhece um pouco sobre a história da ARCHSCAPE, mas hoje, vai conhecer um pouco mais sobre o nome que existe por trás do escritório. Hoje, você confere um papo com o arquiteto e  paisagista Gustavo Garrido, o profissional idealizador da ARCHSCAPE.

Aqui, vai conhecer um pouco mais da sua jornada profissional, como se interessou pelo paisagismo e de que forma isso se integra nos seus projetos de casas de campo. Ah, e também vai ver um pouco sobre tendências de arquitetura no Brasil. Confira!

#1. Como você descobriu que seria arquiteto e como foi o seu início?

Desde pequeno eu sempre gostei de desenhar à mão livre e até uns 7 ou 8 anos eu costumava desenhar bastante, copiava os desenhos animados. Já na escola, eu passei a gostar muito também de desenho geométrico, feito com régua e compasso.

Eu não tinha nenhuma referência próxima, de parentes ou amigos, na arquitetura e eu nem sabia ao certo o que era. Mas eu já tinha um interesse dentro de mim, talvez pela minha mãe ser professora de artes e eu acompanhar de perto o ofício dela, pode ser que isso tenha alguma influência inconscientemente.

Quando terminei o ensino fundamental, ingressei na Escola Técnica Federal de São Paulo e lá eu podia escolher algum curso técnico de minha preferência. Já nesta época eu tinha na minha cabeça edificações, mas também era uma coisa não muito óbvia para mim.

Acabei optando por mecânica, muito mais por ouvir mais os outros do que a mim mesmo: meu pai tinha uma empresa de retífica de motores e seria “mais fácil” seguir seus passos. Na mecânica tinha aulas de desenho técnico com escalímetro e compasso, desenho cad, confecção de peças em aço e madeira. E apesar de gostar desse aprendizado de produzir o que projetamos, sentia que não o mundo da engenharia mecânica não era o que queria pois faltava a arte nessa equação. No último ano do curso, ao pesquisar mais sobre as profissões, percebi que era arquitetura o que eu queria.

Decidi fazer o cursinho e prestar vestibular específico para arquitetura e passei na USP. E é aí que entra o segundo capítulo. Quando cheguei na USP, que é a meca da arquitetura brasileira, foi um pouco difícil. Como eu disse, não tinha nenhuma referência nesse meio, não sabia quem eram os arquitetos mais legais, quem eram as pessoas que eu tinha que conhecer.

É claro que eu ia aprender isso na faculdade, mas via colegas que já tinham parentes arquitetos, ou que já tinham alguma coisa mais específica de direcionamento profissional, obviamente saiam na frente.

No primeiro ano eu passei pelas disciplinas e uma das que eu mais me identificava era de fazer maquete de um espaço livre, praça com edificações, ou alguma coisa assim. Foi aí que comecei a tomar gosto pelo projeto do espaço livre, mas só vim a entrar em contato com a questão do paisagismo a partir do terceiro para o quarto ano.

Gustavo Garrido na Época de faculdade

#2. Desde o começo seu interesse já era Arquitetura e Paisagismo?

Nas matérias de projeto, eu passei a me identificar muito mais com as de espaços livres, de praças, parques, etc. O professor Silvio Macedo, que infelizmente faleceu de Covid recentemente, era o diretor de um grupo de pesquisa chamado Quadro do Paisagismo no Brasil e fazia pesquisa na área do paisagismo.

Ele já tinha me chamado no primeiro ano e na época eu não me interessei, porque estava buscando outras linhas de pesquisa, mas desta vez decidi aceitar

Lá no grupo de pesquisa, eu tinha uma liberdade bacana para fazer alguns materiais, tanto que elaborei e produzi 3 Publicações digitais sobre a história do paisagismo, é claro que orientado pelo professor Silvio: Paisagismo Contemporâneo, Paisagismo Contemporâneo no Brasil e História do Paisagismo.

Quando estava nesse grupo de pesquisa, o Quapá, uma das principais vertentes era ir as cidades e fazer um levantamento de praças e parques que tinham e fazer um desenho específico para criar um banco de dados. Esse banco de dados de praças e parques serviam de material primário para o desenvolvimento de uma série de pesquisas acadêmicas, que deram origem a vários livros, dos quais eu participei.

Outra pessoa que foi muito chave para mim na escolha do Paisagismo foi Sérgio Santana, que é um arquiteto paisagista formado nos Estados Unidos, com quem a gente faz muitas parcerias hoje em dia.

Quando passamos a estudar projetos privados ,ou seja, condomínios com projetos de paisagismo elaborados, centros empresariais e etc., foi que o trabalho do Sérgio me saltou aos olhos, porque tinha uma questão de desenho muito forte presente. Eu vi os desenhos dele, e isso foi uma coisa que realmente me apaixonou, pois juntava o desenho com a questão do espaço livre, das grandes áreas. Ele foi a pessoa que me ensinou o poder do desenho e da arte para a transformação dos espaços.

Eu já sai da faculdade sendo direcionado para o paisagismo, porque quando me formei fui direto ao escritório do Sérgio procurar emprego. E eu fui contratado! O escritório tinha poucas pessoas, mas foi um processo de desenvolvimento muito grande, porque houve um boom imobiliário e o escritório cresceu rapidamente. Dentro de três anos eu já era o coordenador. Foi realmente um crescimento e um aprendizado muito grande.

#3. Como surgiu o interesse por casas de campo?

No escritório do Sérgio Santana fazíamos trabalho em diversas escalas. Paralelamente, eu fazia alguns projetos de casas para um amigo ou outro, pessoas conhecidas que vinham através da minha esposa ou de amigos.

Depois que saí de lá, eu abri um escritório de arquitetura com outros colegas, no qual a gente focou no mercado imobiliário, ou seja, o projeto da edificação em si e da área de lazer, que era a minha especialidade.

Mas, ainda assim, eu percebia que o paisagismo para prédios tinha muitas limitações. No final das contas, o foco do projeto imobiliário é, sem dúvida, o prédio, a parte da arquitetura, das unidades habitacionais. O lazer, nesses casos, serve muito mais para um maior apelo de venda para o empreendimento. Os terrenos que a gente pegava não eram tão grandes, tão generosos. Dessa forma, o peso do paisagismo não era muito grande.

Anos depois, quando abri a ARCHSCAPE e voltei a fazer projetos de residência, percebi que, quando a gente pega uma casa de campo, pega um terreno maior, o peso do paisagismo cresce substancialmente em termos de foco, de dimensão e de importância, pois quem vai para uma casa de campo, o diferencial é o jardim, obviamente.

Se quisesse apenas o espaço construído, você fica em um apartamento na cidade, não é mesmo? No interior, ou numa casa de campo, o terreno é mais barato, então você consegue comprar uma área maior para fazer a casa.

Nisso, eu vi uma grande oportunidade para as casas de campo, de poder fazer uma coisa muito legal no âmbito da arquitetura e paisagismo na casa de campo, sendo que o paisagismo seria a grande vedete, o grande apelo e onde eu teria um espaço muito maior para colocar minhas ideias.

#4. Como você vê a importância da integração entre os dois?

Eu acho importante pelo simples fato de que quando você constrói, é sobre um terreno e essa área precisa ser trabalhada, modelada. Quando você trabalha só com foco nas áreas internas, resulta em gerar uma arquitetura muito pobre, que muito pouco explora as oportunidades de insolação e convívio com o espaço externo, é quase como se fizesse um apartamento que está descolado do chão.

A importância da integração é justamente você, ao conceber a casa, enxergar as oportunidades de integração entre ambientes internos e externos que, mais uma vez eu digo, é a grande vantagem de se ter uma casa em relação a um apartamento.

Quando você trabalha, principalmente casas de campo em terrenos maiores, a importância do terreno se torna cada vez maior.

O que a gente pode somar também a essa questão é que a integração entre espaços internos e externos propicia maior amplitude de espaços. Por exemplo, vamos supor que você tenha um terreno de 800 m², é um terreno grande, mas não gigantesco.

Em um projeto arquitetônico-paisagístico bem elaborado, os espaços acabam parecendo maior do que eles realmente são, justamente por esse fato de não ficar necessariamente delimitado por uma parede interna.

Essa integração proporciona um trabalho diferenciado em vários aspectos e o trato com a água é um deles. Ela pode não ficar limitada apenas a um espelho d’água, ela pode adentrar a sala, por exemplo, trazendo inclusive vantagens térmicas para o ambiente, com técnicas para refrescar a casa.

Por que os projetos das casas de campo te atraem/interessam?

Esse tema da casa de campo me interessa justamente por poder proporcionar mais integração entre espaço interno e externo. No interior, em geral, as cidades são menos violentas, as pessoas têm uma postura menos defensiva, as casas não têm tantas grades, muros e toda aquela parafernália de segurança que, na cidade grande, temos que acabar optando por utilizar.

Eu também acho que, numa casa de campo, as pessoas estão mais abertas a novas experiências, diferentemente de uma casa urbana. O que eu quero dizer com isso é que o arquiteto tem mais liberdade para criar.

Eu já fiz alguns projetos onde não há um corredor de circulação interno para os quartos, você acessa os cômodos pelo ambiente externo. Ou conceber uma casa, por exemplo, como se fosse um conjunto de bangalôs, onde você circula por espaços abertos, porém cobertos.

Essas experiências sensoriais que são interessantes numa casa de campo, em geral, as pessoas não se sentem muito à vontade nos centros urbanos, principalmente pela questão da segurança. Você dispor também de terraços habitáveis para ter uma vista bonita, todas essas alternativas, numa casa de campo, são mais do que desejáveis!

As pessoas já vão com o espírito de querer aproveitar todas as possibilidades que o terreno pode proporcionar, e elas têm sempre o lazer na cabeça. Lembrando que, quando se fala em lazer, se fala em paisagismo, se fala nos espaços livres. É por isso que eu acho que o tema da casa de campo é um perfeito trabalho em conjunto entre arquitetura e paisagismo.

Quais as tendências da arquitetura contemporânea e como devemos pensar no desenvolvimento dessa arquitetura?

É justamente essa integração dos espaços internos e externos. Outra tendência é a utilização dos materiais nas suas texturas e características originais. Por exemplo, se você usa o concreto, deixa ele aparente, se usa a madeira, usa ela aparente.

Materiais que “imitam” texturas estão totalmente fora de contexto: porcelanato que imita madeira; papel de parede que imita pedra, etc, são coisas abomináveis e muito pobres em termos de experiência sensorial.. A tendência é usar a própria pedra, madeira, concreto e deixar isso aparente.

Em termos de espaço, reforço que é a integração entre ambientes interno e externo, dando mais amplitude para a casa. Criar espaços inusitados, como salas com iluminação zenital, home office integrado ao estar, jardins internos, são estratégias interessantes. Fazer com que a casa seja menos aquilo que estamos acostumados a ver em sites e revistas de arquitetura, uma coisa super arrumada, que não tem uma almofada fora do lugar.

O que está em alta agora é casa com afeto, com vida, com cara de casa mesmo, que tenha aquela “bagunça organizada”. Essa bagunça do dia a dia com o espaço para essa nova arquitetura. Além, é claro, da arquitetura biofílica (que você pode ler mais sobre clicando aqui). Acredito que essas são as grandes tendências hoje em dia.

Como é a arquitetura contemporânea no Brasil?

A gente vive um momento muito rico no Brasil em termos de arquitetura. Vivemos um período anterior, na década de 80 e 90, que se copiava muitas coisas de décadas passadas. Aquelas arquiteturas temáticas, focadas no passado clássico. Isso se foi.

Hoje, a arquitetura está muito mais brasileira, principalmente, está muito mais explorando essas novas tendências. Acho que há dois pontos aí que são muito importantes, um deles é a questão da revalorização da arquitetura moderna.

Esse movimento, que começou na década de 30, presava pelo uso dos materiais nas suas características, principalmente do concreto e no potencial plástico que esse material permite.

Até então, o potencial do concreto armado não era explorado. Ele pode ser moldado de várias formas, é como se fosse um bolo: você faz a forma, concreta e dá a forma que você quiser. As formas que a gente vê hoje na arquitetura são, em grande parte, resultado das possibilidades que o concreto armado ofereceu lá atrás.

Hoje, temos essa revisitação aos grandes arquitetos modernos, como Paulo Mendes da Rocha e, numa vertente mais contextualista, destacaria também os trabalhos de Richard Neutra e Frank Lloyd Wright. Esses são os principais que eu poderia destacar.

Outra questão que também influencia na arquitetura contemporânea é a crescente qualificação e, consequentemente, valorização da mão de obra. Isso acaba encarecendo as obras, mas nos dirige a possibilidades pré-fabricadas, que antes não eram tão exploradas. Temos a possibilidade de pré-fabricar toda uma casa, por exemplo, viabilizando obras em locais remotos, de difícil acesso e sem mão de obra local. Essas soluções contudo ainda são mais onerosas, principalmente por questões fiscais sobre produtos industrializados.

Então acredito que a arquitetura brasileira está hoje ocupando seu lugar de importância no panorama mundial, retomando a sua relevância que tinha num passado distante.

Quem são suas inspirações na arquitetura mundial hoje em dia?

As minhas maiores inspirações são as obras não só de Paulo Mendes da Rocha e João Vilanova Artigas, Lina Bo Bardi, Le Corbusier, mas da geração anterior à minha, como o Ângelo Bucci e Marcos Acayaba, meus antigos professores que possuem obras maravilhosas. Destaco ainda o Jader Almeida, que tem se destacado principalmente em projetos de interiores minimalistas.

Os trabalhos do Frank Lloyd Wright e Richard Neutra, são sempre atuais e ainda hoje inspiram muitos escritórios que revisitam essas fontes e propõem novas ideias.

Também acho muito importante prestar atenção nos grandes escritórios de arquitetura paisagística no mundo, que estão fazendo coisas muito interessantes no sentido de integrar arquitetura e paisagismo. Escritórios como o Turenscape, a Design Workshop, SWA, são escritórios de ponta que estão fazendo coisas muito interessantes e que são facilmente traduzíveis numa arquitetura residencial para o bem-estar das pessoas.

Para conhecer mais sobre os projetos de Gustavo e da própria ARCHSCAPE, confira o portfólio de projetos!